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Renda Básica: Uma Agenda Transversal. Por Mônica de Bolle
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Cidadania
Dom, 28 de Junho de 2020 01:42
Monica-de-bolle_Propostas de renda básica universal têm merecido destaque por ocasião da pandemia, e a agenda se deslocou mais para o centro do debate público. Dada a inédita centralidade da renda básica entre nós, é importante esclarecer seu princípio, suas consequências, seus efeitos na sociedade. Para elucidar esses aspectos a seu respeito, começo pela ideia de que princípio não se confunde com consequência. Como diz a velha máxima, uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. O princípio de uma política pública é aquilo que a norteia. As consequências são a cascata de benefícios para a sociedade. Às vezes esses benefícios enfocam alguns grupos: esse é o caso do Bolsa Família. A renda básica é diferente. A renda básica universal, a renda básica da cidadania defendida e tornada lei pelo ex-senador Eduardo Suplicy, é para todos. Ela não é focalizada; sendo para todos, é transversal.

 

O que isso significa? Transversalidade significa que a política pública - no caso, a renda básica - contempla todos, possibilitando a todos alcançar aquilo a que têm direito: inclusão na cidadania. Transversalidade implica que não importam a raça, o status no mercado de trabalho, o gênero, a orientação sexual; a pessoa fará jus à renda básica, pois esta não contempla diferenças. A renda básica tende a nos unir em nome de tudo aquilo que compartilhamos. É esse o seu princípio: o da justiça social para todos. Embora seja esse o seu princípio, ela atende aos anseios de todos aqueles que estão nas margens da cidadania por estruturas de desigualdades, por exemplo, negros, pobres, mulheres, a diversidade sexual e de gênero que não tenham seus direitos econômicos efetivados. A renda básica da cidadania corta transversal e simultaneamente essas imensas injustiças históricas. Essa é, portanto, uma das suas consequências.

Por que é importante insistir no caráter transversal da renda básica nesse momento? Precisamos de uma agenda com potencial unificador em um país cindido e com um governo cujo objetivo é acentuar as divergências existentes na sociedade brasileira – uma espécie de estratégia de "dividir para conquistar", que abre espaço para a tirania à medida que nos afasta uns dos outros. É mais possível neutralizar aquilo que nos divide apelando àquilo que nos une. A renda básica tem esse potencial; por isso, nunca foi tão importante refletir e falar sobre ela quanto agora. Também por isso ela passou de algo marginal, "utópico" no sentido pejorativo, para o centro do debate. Se ainda não há consenso sobre o seu desenho, tem se formado um consenso sobre a importância de se pensar sobre a renda básica da cidadania. Assim ela foi trazida para o debate público e assim é que deve permanecer.

Para que o debate produza mais luz que calor, também é importante distinguir o princípio unificador da renda básica de suas consequências. Se ela beneficia negros, ela pode ser, na prática, antirracista; se beneficia mulheres, pode ser, na prática, igualitária em matéria de gênero, e por aí vai. Mas seus efeitos igualitários para grupos específicos não implicam enxergar a renda básica como norteada por diferenças. Não é que as causas do antirracismo, da igualdade de gênero ou da diversidade sexual não importem: elas importam, e muito. São justas, necessárias e urgentes. Mas essas causas são lutas de grupos particulares dentro da sociedade, ainda que alguns deles formem maiorias numéricas dentro da população brasileira, e essas lutas precisam ser generalizadas. Inverter princípio e consequência implica, nesse caso, confundir a transversalidade com os benefícios que cada grupo dela extrai, o que pode tornar a agenda da renda básica menos potente ao colocar o princípio da cidadania para todos, da justiça para todos, em segundo plano.

Passamos por um momento de transição, e transições costumam ser turbulentas. É passada a hora de falar sobre o racismo na sociedade brasileira, sobre a disparidade entre homens e mulheres, sobre a precariedade da vida de pessoas transgênero, sobre as estruturas que causam as nossas mais profundas desigualdades. Contudo, confundir essas lutas com a luta pela renda básica é um equívoco. Que a renda básica venha para desconstruir as estruturas da desigualdade brasileira. Que ela tenha a capacidade, a partir dos princípios de cidadania e justiça social, de unir a todos sem distinção. É dessa forma que a agenda, de fundamental importância para o futuro do país e que traz consigo a demanda por uma estrutura tributária mais justa, que onere progressivamente renda e patrimônio, vai angariar cada vez mais apoio.

Artigo publicado originalmente na Revista Época 

https://epoca.globo.com/monica-de-bolle/coluna-renda-basica-uma-agenda-transversal-24499444

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