Salvador, 28 de March de 2024
Acesse aqui:                
Banner
facebookorkuttwitteremail
A esquerda precisa fazer uma releitura do Brasil, por José Dirce
Ajustar fonte Aumentar Smaller Font
Cidadania
Seg, 12 de Outubro de 2020 07:19

Jose_DirceuÉ preciso ler para além da conjuntura mas, ao mesmo tempo, estar à altura dos novos tempos que não podem ser enfrentados, sem profundas mudanças na esquerda e no PT, seu maior partido. Este também é um fato histórico irrefutável.

 

Se não entendermos que houve uma mudança de período histórico e de ciclo político não estaremos em condições de representar as forças sociais e políticas para superar essa tragédia nacional e social que vivemos.

Um espectro ronda a esquerda. Será que ela perdeu o bonde da história e não sobrevive às profundas mudanças no capitalismo brasileiro, como as produzidas pelo golpe de 1964 e, agora, pelo governo Bolsonaro e uma gestão ultra liberal? Estaria esgotado seu papel já que o país que deu origem ao PT, por exemplo, não existe mais, nem aquela classe operária industrial dos anos 1970, 1980? Sobreviveremos à desindustrialização, precarização da força de trabalho, informalidade, pejotização, reforma trabalhista, terceirização e reforma da previdência, ao fim do imposto sindical? O que será do movimento sindical?

Quem deterá Bolsonaro e sua aliança com os negociantes da fé, os militares, as milícias, o capital financeiro, o agronegócio, o Centrão e sua poderosa coalização nas redes e com as TVs Record, SBT e RedeTV? Como deter o avanço do autoritarismo, obscurantismo e fundamentalismo religioso, o ataque frontal à cultura, à educação, à Amazônia e à ciência?

Serão o PT e a esquerda derrotados nas eleições deste ano sem alianças nas principais cidades?

Sempre me guiei pela máxima de que não podemos atribuir ao adversário as razões de nossa derrota, mas isso não significa não identificar e não responder como chegamos, de novo, a um governo militar de extrema direita e a um presidente como o que temos, que acabou de se revelar por completo nas Nações Unidas. Sem desconhecer os erros que cometemos –e não foram poucos– e nossa ausência pós 2000 nos territórios, nos bairros, no chamado trabalho de base, na vida real e na luta pela sobrevivência nas periferias como prioridade e nosso atraso mortal em entender e dominar a nova forma de comunicação via redes. É preciso sempre recordar que poucos partidos no mundo suportariam à guerra total a que fomos submetidos.

O alvo da artilharia das elites, apoiadas na Justiça militante, foram os petistas e seu eleitorado e base social; uma artilharia cerrada de 2013 a 2018, incluindo o golpe do impeachment e o processo sumário, de exceção, que levou Lula a uma condenação injusta e à sua prisão, quando o mais provável era como candidato vencer no primeiro turno.

A campanha midiática, via Lava Jato, foi devastadora não só para a imagem do PT, mas principalmente para sua capacidade de mobilizar, organizar e lutar. O resultado foi a eleição de um presidente com o qual, agora, parte significativa das forças e do eleitorado que derrubaram o governo Dilma e impediram Lula de ser candidato, não sabe como lidar. Querem fazer oposição e mesmo processá-lo por crime de responsabilidade, mas, temerosos da esquerda, da tutela militar e de perder seus privilégios e a agenda liberal, se iludem que podem controlar a criatura via Congresso Nacional e a Suprema Corte. Em parte, este caminho traz resultados, já que Bolsonaro só não é um ditador pelos limites impostos pelo Parlamento, pelo Judiciário pela esquerda e pela oposição de grande parte da mídia.

HÁ SAÍDA

Podemos avaliar a capacidade da esquerda pela vitória de Bolsonaro ou por seu governo? Claro que não. Se há uma força política social que se opõe ao bolsonarismo esta é o PT e as esquerdas.

Temos saída não apenas porque Haddad teve 32 milhões de votos em condições totalmente desfavoráveis, com fake news e seu financiamento ilegal, como, no segundo turno, 45 milhões de eleitores disseram não a Bolsonaro. É preciso ver o Brasil como um todo. Se é verdade que perdemos base eleitoral e social para a direita no Sul-Sudeste, também é um fato inconteste que no Nordeste temos uma ampla base não só eleitoral, mas social e institucional. O PT e o Lulismo lá estão consolidados e seus governos bem avaliados.

Neste cenário, a explicação do suposto fim da classe trabalhadora não faz sentido, seja porque 33 milhões de trabalhadores são registrados e os sindicatos na pandemia se fazem presentes na vida e no dia a dia desses trabalhadores, como buscam novas formas de organização e financiamento. E todos têm consciência de que mais da metade da população economicamente ativa está desempregada.

No passado, lideranças de direita também nos derrotaram com voto nas classes populares, desde Adhemar de Barros, passando por Jânio, Maluf, Collor e mesmo FHC. Assim, trata-se de disputa política, social, cultural, e não podemos dar como perdida a batalha que apenas se inicia. Isso não significa que podemos continuar sem uma releitura do Brasil e do mundo de hoje, principalmente com a pandemia e as contra reformas de Guedes. Da mesma forma que ocorreu no golpe de 1964, há uma coalizão sólida, para além de Bolsonaro e sua aliança, que de forma autoritária, conservadora, de cima para baixo, busca de forma tardia adaptar o Brasil à ordem internacional dos Estados Unidos e do mundo hegemonizado pelo capital financeiro, uma ordem que se esgota e que só aumenta a desigualdade e os riscos de guerras comerciais e militares.

Aqui, as elites resistem e apoiam as reformas neoliberais que, na prática, representam o desmonte do Estado Nacional e da rede de proteção social, de bem estar construída nos últimos 100 anos e consolidada pela Constituição de 1988 e pelos governos petistas.

Toda experiência do passado nos indica que haverá resistência, luta social e política contra essa retirada de direitos e da participação do trabalho na renda nacional, para além da luta democrática, contra o obscurantismo e o fundamentalismo religioso, a devastação da Amazônia, o ataque à cultura e à ciência, e os riscos do autoritarismo. Foi assim após o golpe de 1964, na década de 1970, nos anos 1980 e na era FHC. A verdade histórica é que nem a ditadura deteve a luta popular e, logo depois do golpe, perdeu as eleições em Minas e Rio, o que a levou a editar o Ato Institucional 2. Depois, diante da resistência nas ruas e fábricas, decretou o AI 5. Mesmo assim, foi derrotada em 1974 e perderia no colégio eleitoral em 1978 não fosse o pacote de Abril que viabilizou a continuidade com Figueiredo.

TRADIÇÃO DE GOLPE

O povo brasileiro deu quatro mandatos ao PT e à esquerda. Nada foi fácil ou caiu do céu. Foram décadas de lutas e muitas derrotas. A regra no Brasil é golpes, ditaduras, viradas de mesa, rasgando os contratos políticos e sociais, o último, o da Constituição de 1988. Quando as elites perdem ou estão para perder o poder que concentra a riqueza, renda e propriedade, o controle da informação e da formação, sempre recorrem a meios ilegais e ao arbítrio para depois serem vítimas de seu despudor com a riqueza e o poder.

Momentos como o que estamos vivendo, que as pesquisas retratam, nos trazem à memória os anos do milagre econômico, do Ame-o ou Deixe-o, do Brasil Pra Frente, os anos do Plano Cruzado, do Plano Collor, e mesmo o longo período de FHC.

É preciso ler para além da conjuntura mas, ao mesmo tempo, estar à altura dos novos tempos que não podem ser enfrentados sem profundas mudanças na esquerda e no PT, seu maior partido. Este também é um fato histórico irrefutável. Se não entendermos que houve uma mudança de período histórico e de ciclo político não estaremos em condições de representar as forcas sociais e políticas para superar essa tragédia nacional e social que vivemos.

José Dirceu de Oliveira e Silva, 74 anos, é advogado. Foi deputado estadual e federal pelo PT e ministro da Casa Civil (governo Lula). Foi condenado em 1ª Instância na Lava Jato a 32 anos e 1 mês de prisão. Aguarda em Brasília a decisão do TRF-4, tribunal de 2ª Instância da Justiça Federal, sobre condenações já proferidas pelo juiz Sérgio Moro na 1ª Instância.

Artigo publicado originalmente em https://www.poder360.com.br/opiniao/brasil/a-esquerda-precisa-fazer-uma-releitura-do-brasil-por-jose-dirceu/

Compartilhe:

Última atualização em Qui, 15 de Outubro de 2020 07:25
 

Adicionar comentário


Código de segurança
Atualizar

FOTOS DOS ÚLTIMOS EVENTOS

  • mariofoto1_MSF20240207-167Lavagem Funceb. 08.02.24. Alb 2. Foto: Mário Sérgio
  • mariofoto1_MSF20240207-042Lavagem Funceb. 08.02.24. Alb 1. Foto: Mário Sérgio
  • mariofoto1_MSF20240203-054Fuzuê Alb 1. 03.02.2024. Fotos: Mário Sérgio
  • mariofoto1_MSF20240203-159Fuzuê Alb 2. 03.02.2024. Fotos: Mário Sérgio
  • mariofoto1_MSF20240203-248Fuzuê Alb 3. 03.02.2024. Fotos: Mário Sérgio
  • mariofoto1_MSF20240203-297Fuzuê Alb 4. 03.02.2024. Fotos: Mário Sérgio
  • mariofoto1_MSF20240112-0972Beleza Negra do ilê. Alb 1. 13.01.24 By Mario Sérgio
  • mariofoto1_MSF20240112-1035Beleza Negra do ilê. Alb 2. 13.01.24. By Mário Sérgio
  • mariofoto1_MSF20240112-1339Beleza Negra do Ilê. Alb 3. 13.01.24 By Mário Sérgio
  • mariofoto1_MSF20240112-1469Beleza Negra do Ilê. Alb 4. 13.01.24 By Mário Sérgio

Parabéns Aniversariantes do Dia

loader
publicidade

ENSAIOS FOTOGRÁFICOS

GALERIAS DE ARTE

Mais galerias de arte...

HUMOR

Mais charges...

ENQUETE 1

Qual é o melhor dia para sair a noite?