Fachin defendeu Moro como nem Dallagnol foi capaz de fazer. Por Rafael Moro Martins |
Dando o que Falar | |||
Dom, 09 de Agosto de 2020 00:53 | |||
Uma enorme coleção de materiais nunca revelados fornece um olhar sem precedentes sobre as operações da força-tarefa anticorrupção que transformou a política brasileira e conquistou a atenção do mundo.
O coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba falava sobre as gigantescas manifestações populares daquele domingo a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff, que alçaram o então juiz da Lava Jato à posição de herói nacional. Mas nem o procurador, um admirador de Moro, conseguiu fazer uma defesa pública tão contundente do ex-juiz no levantamento do sigilo da delação de Antonio Palocci a seis dias da eleição presidencial como a que o ministro Edson Fachin fez ontem durante julgamento no Supremo Tribunal Federal. O episódio está registrado nos arquivos da segunda turma do STF, que deliberava sobre a retirada da delação do ex-ministro Antonio Palocci de um processo da Lava Jato contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Fachin votou a favor da Lava Jato e contra a exclusão. E foi voto vencido: os ministros optaram por limar a delação de Palocci da acusação contra Lula por 2 votos a 1. Fachin registrou em seu voto que não seria possível provar que houve atuação irregular de Moro ao anexar a delação faltando seis dias para o primeiro turno de 2018. A delação abasteceu capas de jornais, revistas e portais de notícias e movimentou as redes de WhatsApp da extrema direita às vésperas da eleição. Quem discorda de Fachin é o próprio Deltan Dallagnol. Ele se debruçou sobre o caso com o procurador Roberson Pozzobon, colega de Lava Jato, e a conclusão de ambos foi de que Moro ultrapassou, sim, os limites. Em 11 de novembro de 2018, dez dias após Moro se tornar superministro de Bolsonaro, Pozzobon fez a seguinte explanação a Dallagnol, pelo Telegram, enquanto debatiam texto que assinariam juntos: Pozzobon –12:58:54 – Acho que estamos fracos de bons argumentosPozzobon –13:00:03 – Há 2 grandes casos que resultaram em intensas críticas à LJ-CWB no tocante ao temaPozzobon – 13:00:15 – i) Audio do LulaPozzobon – 13:00:25 – ii) Delaçào do PalocciPozzobon – 13:00:59 – No STF, um caso de grande levantamento do sigilo foi o do levantamento do sigilo dos colaboradores da ODEPozzobon – 13:02:07 – Fui analisar esse ultimo caso, sobre o qual não houve grandes críticas da sociedade (que deve ter ficado anestesiada com a próprio teor dos termos), para ver se encontrava fundamentos que se aplicassem aos levantamentos de sigilo no primeiro grauPozzobon – 13:03:14 – [mensagem não encontrada]Pozzobon – 13:03:18 – Não me parece que é o casoPozzobon – 13:03:36 – [documento não encontrado]Pozzobon – 13:04:21 – O Fachin basicamente sustentou que o levantamento do sigilo não mais interessava as investigações, nos termos do que o próprio PGR havia se manifestadoPozzobon – 13:05:08 – Penso, contudo, que se o sigilo tivesse sido mantido para o aprofundamento das investigações (sendo revelado caso a caso mais tarde) os resultados em termos de obtenção de provas seriam muito melhoresPozzobon – 13:05:20 – Pode-se argumentar que:Pozzobon – 13:05:35 – i) o clima (de insegurança) da classe política iria se tornar insustentávelPozzobon – 13:06:09 – ii) que a sociedade merecia saberPozzobon – 13:06:34 – Mas penso que ambos os motivos não afastariam a possibilidade de juntar os termos depois de devidamente aprofundadosPozzobon – 13:06:52 – Aí é o caso de considerar se a questão não era:Pozzobon – 13:07:01 – i) tirar um pouco da pressão que pesava sobre FAchinPozzobon – 13:07:35 – ii) dar a Janot a publicidade decorrente antes do termino de seu mandatoPozzobon – 13:07:47 – Voltando para os casos aqui de CWBPozzobon – 13:08:37 – A própria Laurinha, que acompanha o caso, já disse que foi bem esquisito juntar os termos do Palocci na AP naquele momentoPozzobon – 13:09:40 – Uma questão que todo mundo fala aqui (e que se repete nos jornais), para criticar o Moro, é o fato de que Moro levantou o sigilo da delação do Palocci poucos dias antes do 2 turno. Tenho dito que não é bem assim, pois o processo estava com prazo para alegações finais e que naquele momento havia se encerrado o prazo que o TRF deu para a defesa (PF que fez, na verdade) entregar as provas de corroboração do acordo.Pozzobon – 13:09:40 – A “desculpa” é ruim (principalmente porque o processo já havia ficado parado alguns meses). mas se alguém conseguir agregar algum argumento, seria bom pra ajudar na comunicação, interna e externamentePozzobon – 13:11:57 – Podemos pesquisar mais, mas pelo que Laurinha falou, parece-me que se fossemos tentar explicar isso ficaria superficial ou pior do que a encomendaPozzobon – 13:13:18 – Como agravante nesse caso, que distoa inclusive do caso do levantamento do sigilo da ODE por FACHIN, não houve pedido do MPF. Ao contrário, o MPF manifestou-se contrariamente: – celebração do acordo – a sua homologação – e a consideração dos elementos nele constantesPozzobon – 13:13:58 – Aí sobra o caso do levantamento do sigilo do audio do Lula…Pozzobon – 13:14:50 – Que não nos ajuda muito em termos de argumentos, principalmente quando analisado em conjunto com esse caso do PalocciPozzobon – 13:14:55 – Para piorar mais aindaPozzobon – 13:15:08 – Ambos os casos de levantamento aqui no primeiro grau foram sobre questoes do PTPozzobon – 13:15:27 – O que reforça o discurso de vitimização desse partidoPozzobon, que fora incumbido por Dallagnol de limpar a barra do “grande líder brasileiro” Moro, confessou ser incapaz de dar conta da tarefa. O livro foi publicado com o capítulo escrito por ambos. Mas não traz qualquer defesa das decisões de Moro nesses casos. O MPF era contra a delação de Palocci. O ex-tesoureiro petista correu, então, à Polícia Federal e fez as mesmas acusações desprovidas de provas robustas que os próprios procuradores da Lava Jato já haviam mandado para o lixo. A PF abraçou as acusações do ex-ministro e selou o acordo. Tratou-se, muito mais, de uma disputa de poder entre agentes públicos do que de revelações que abrissem caminho para novas investigações em benefício da sociedade. Palocci, que de bobo nada tem, se aproveitou. E, hoje, assiste a tudo de seu belo apartamento em Moema, bairro nobre paulistano, graças ao acordo. Moro, que achava a delação fraca, resolveu torná-la pública semanas após recebê-la – e faltando seis dias do primeiro turno das eleições presidenciais. Óbvio, as acusações quase sem provas do ex-ministro foram manchetes em jornais e telejornais. Era 1º de outubro de 2018, uma segunda-feira. Exatos 30 dias depois, o então juiz anunciava que iria ocupar assento no primeiro escalão do governo de extrema direita de Jair Bolsonaro. Como se sabe, Lula era favorito nas pesquisas até ser preso por ordem de Moro, após ter sua condenação ratificada em tempo recorde na segunda instância. O juiz parcialNa tarde de ontem, durante o julgamento que acabou por excluir a delação de Palocci de uma ação penal na qual Lula é réu em Curitiba – acusado de ter recebido propina da Odebrecht – o ministro Gilmar Mendes disse:
As posições de Mendes e Lewandowski não surpreendem. Mendes se tornou crítico feroz da Lava Jato após a revelação dos diálogos mantidos entre Moro e os procuradores pelo Intercept e veículos parceiros. Lewandowski, notório garantista, ganhou fama pelas disputas verbais exaltadas com o relator do mensalão, Joaquim Barbosa. Odiado pela parcela da opinião pública que ansiava pela condenação dos envolvidos, se manteve firme em suas posições desde então. A surpresa é Edson Fachin. Quando ganhou a vaga pela aposentadoria de Barbosa, eu fui colher impressões entre colegas de advocacia e de cátedra a respeito dele. Gente respeitável disse ver em Fachin um intelectual brilhante e um caráter incorruptível. Fachin foi um advogado que fez carreira no direito civil, notadamente em questões de família. Assim, causou algum espanto quando ele se ofereceu para ingressar na cadeira deixada vaga por Teori Zavascki e acabou com a relatoria da Lava Jato (um complexo caso criminal) nas mãos. Como já se sabe, Dallagnol preferia ver seu caso nas mãos de Luís Roberto Barroso. Mas é difícil imaginar que ele esteja insatisfeito com a condução dada pelo sorteado. Afinal, aha, uhu, o Fachin é nosso. Artigo publicado originalmente em https://theintercept.com/2020/08/05/fachin-defendeu-moro-dallagnol-delacao-palocci/
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Última atualização em Seg, 10 de Agosto de 2020 04:56 |
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