Professor identifica berço do bolsonarismo no Orvil, o livro que embala viúvas do general Sylvio Frota. Entrevista com João Cezar de Castro Rocha |
Dando o que Falar | |||
Qua, 19 de Agosto de 2020 07:28 | |||
“As pessoas não levam a sério a guerra cultural bolsonarista.” O tom é de alerta. É essa mesmo a intenção do professor doutor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), João Cezar de Castro Rocha, que trabalha na conclusão de um livro sobre o que chama de guerra cultural bolsonarista. “É uma guerra cultural que fala dois idiomas”, explica. De acordo com as hipóteses levantadas pelo professor titular de Literatura Comparada, doutor em Letras pela UERJ e Literatura Comparada pela Stanford University, nos Estados Unidos, a destruição das instituições e a eliminação simbólica do inimigo interno são pontas de lança do projeto autoritário do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Castro Rocha afirma: “Há um ressentimento enorme. Há um revanchismo evidente. Há um desejo de destruir todas as instituições que caminharam no sentido do fortalecimento da democracia e da salvaguarda das instituições”. E tudo parte de um livro secreto escrito pelos militares a partir de 1986 sob o comando do então ministro do Exército, general Leônidas Pires Gonçalves. De onde parte o que o sr. chama de guerra cultural na estrutura do governo Bolsonaro? Havia um conjunto de declarações que parecia tão descolado da realidade que de fato conformava uma espécie de Brasil paralelo. Mas essa explicação não me satisfazia. Me parece que é um grave problema, porque nós temos uma tendência a reduzir essa situação gravíssima que vivemos à caricatura. O que proponho é passar da caricatura à caracterização. Isto é, tentar compreender a guerra cultural bolsonarista na sua própria dinâmica. Tentar entender qual é sua fonte, qual é a origem desse pensamento, quais são as dinâmicas que lhe são próprias. Há um equívoco quando reduzimos a guerra cultural a uma caricatura. Estamos, em uma boa medida, imaginando que a guerra cultural bolsonarista é comparável às guerras culturais que ocorrem nos Estados Unidos e na Europa há mais de uma década. A hipótese que proponho é bastante diferente. Proponho deixar de se relacionar com este modelo de guerra cultural, que na Europa e nos Estados Unidos tem de 15 a 20 anos. Já no século XIX na Alemanha houve a “Kulturkampf” [a batalha pela cultura]. Nesses casos, em geral, o que ocorre é uma total disputa de valores, de um lado progressistas, de outro conservadores. De um lado uma visão de mundo de esquerda, de outro uma visão de mundo de direita, e assim sempre. No caso da guerra cultural bolsonarista, que não deixa de ter contato com esse tipo de modelo, proponho, a partir do estudo aprofundado que tenho feito, que o modelo da guerra cultural bolsonarista tem uma característica muito própria, muito relacionada à história recente brasileira e é a incapacidade que temos de compreender isso que não nos permite reagir a tempo para o que creio que pode ser um momento inédito no Brasil em termos de ruptura e, sobretudo, em termos de paralisação da administração pública. Em um dos artigos publicados recentemente, o sr. faz comentários sobre o documentário “1964 – Brasil Entre Armas e Livros”, do Brasil Paralelo. O sr. diz que o filme faz uma revisão da história da ditadura militar de 1964 a 1985 sob o aspecto de que os militares teriam combatido a luta armada, mas não teria combatido os livros, a cultura e a educação. Onde nasce essa construção de ameaça constante do comunismo no Brasil e até onde ela vai? A guerra cultural bolsonarista realiza, de um lado, uma tradução inesperada, de consequências potencialmente funestas, da doutrina de segurança nacional que foi desenvolvida durante a ditadura. Mas, mesmo antes, pela Escola Superior de Guerra. A doutrina de segurança nacional adaptou o direito internacional público para o caso brasileiro. Na doutrina de segurança nacional, uma vez identificado o inimigo não há dúvida: é necessário eliminá-lo. A guerra cultural bolsonarista tem muito pouco a ver com cultura como nós entendemos e tem muito a ver com a concepção militar da doutrina de segurança nacional de eliminação do inimigo interno. Se você fizer o trabalho mínimo de assistir a alguns vídeos de intelectuais bolsonaristas, o verbo dominante é eliminar. E o substantivo dominante é limpeza. É um vocabulário retirado diretamente do golpe militar de 1964. Como traduzir em um ambiente democrático a doutrina de segurança nacional se a democracia necessariamente implica o contraditório e estar exposto à diferença? Em 1985, depois de um trabalho de seis anos, foi publicado no Brasil um livro que marcou época chamado “Brasil: Nunca Mais”. Seria o livro negro da ditadura militar. De maneira secreta, um grupo de pesquisadores compilou aproximadamente 5 mil páginas de documentos do Superior Tribunal Militar (STM) com processos de subversivos e guerrilheiros. Portanto, todos os documentos que fazem parte do projeto “Brasil: Nunca Mais” foram produzidos pela ditadura militar. Os pesquisadores compilaram uma seleção dos documentos de modo a denunciar para a sociedade brasileira a tortura, o assassinato e o desaparecimento político. Eu tinha 20 anos quando o “Brasil: Nunca Mais” saiu. Foi uma revolução na sociedade brasileira. Ficaram comprovadas de uma maneira muito clara todas as arbitrariedades e a violência da ditadura militar. No ano seguinte, sob a liderança do ministro do Exército do governo José Sarney (MDB), que era o general da linha dura Leônidas Pires Gonçalves, um grupo de militares resolveu revidar. Resolveu, a seu modo, escrever outro livro. Já que o “Brasil: Nunca Mais” se tornou o livro negro da ditadura militar, os militares comandados pelo Leônidas Pires Gonçalves decidiram escrever o livro negro da luta armada, isto é, o livro negro da esquerda. Os militares compilaram material e documentos, sobretudo do serviço de informação da Marinha, do Exército, da Aeronáutica e do Serviço Nacional de Informação (SNI), organizaram dois volumes de aproximadamente mil páginas e queriam publicar o livro. Seria a resposta do Exército ao “Brasil: Nunca Mais”. José Sarney, em 1989, vetou a publicação temendo a radicalização e a polarização que daí poderiam surgir. A partir deste momento, algumas cópias produzidas manualmente circularam entre oficiais de alta patente e poucos militantes de direita. Até que um jornalista, Lucas Figueiredo, especialista na comunidade de informação brasileira, autor do mais importante livro sobre o SNI, “Ministério do Silêncio”, descobriu e teve acesso ao livro. O projeto dos militares se chamava “Orvil”. Livro de trás para frente. O “Orvil” compila em suas mil páginas documentos que mostram a morte de civis em ações da luta armada, que considera que todos os guerrilheiros eram terroristas, que não lutavam pela democracia. E fazia a compilação sistemática desses documentos. Depois, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra aproveitou esse material para publicar o seu livro. Que é o “A Verdade Sufocada”? Além da compilação de documentos e de fatos, os militares procuram mostrar que a esquerda da luta armada, na concepção do Exército, era terrorista e provocou tantos assassinatos e tantas mortes quanto o próprio Exército. É uma interpretação. Uma narrativa. Tem uma linha narrativa que procura interpretar a história republicana brasileira a partir da década de 1920. O que vou dizer aqui é exatamente o que dizem os ideólogos do presidente, exatamente o que diz o ministro da Educação, exatamente a base do documentário e a estrutura de pensamento da produtora de conteúdo audiovisual, Brasil Paralelo. Eis o fundamento de toda ação deletéria deste governo para destruir as instituições. Desde o Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis], que teve a sua estrutura de fiscalização desmontada, até a Capes [Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior], que está sendo destruída passo a passo. A narrativa que o “Orvil” propõe é que o século XX brasileiro assistiu a uma investida constante do movimento comunista internacional para impor ao Brasil uma ditadura do proletariado. É uma narrativa delirante. É uma teoria conspiratória, simplesmente absurda. Segundo o “Orvil”, houve três momentos fracassados. O primeiro foi a fundação do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que assim se chamava em 1922, e a Intentona Comunista de 1935. Primeiro momento derrotado militarmente pelo Exército brasileiro. O segundo momento começaria após o suicídio de Getúlio Vargas e se prolongaria até o golpe militar de 1964. E, de novo, a tentativa teria sido derrotada militarmente. O terceiro momento seria o da luta armada, entre 1968 e 1974. Nas cidades, a luta armada terminou em 1972. Destaca-se 1974 porque nesse ano os últimos guerrilheiros do Araguaia são assassinados pelo Exército. Não são feitos prisioneiros, são eliminados em fidelidade à doutrina de segurança nacional. Ainda em 1974 o presidente Ernesto Geisel começou a desmobilizar o aparato repressivo, o que explica o ressentimento que se encontra na base do “Orvil”. Assim também se esclarece a narrativa conspiratória do quarto e derradeiro momento. Dentro da criação do que o sr. chama de uma narrativa delirante dos ideólogos e membros do governo Bolsonaro de que havia de fato uma ameaça de tomada do poder pelos comunistas… Diz o “Orvil” que em 1974 começou a quarta fase, o momento “mais perigoso”. Na narrativa dos militares do Exército, em 1974, a esquerda, derrotada militarmente mais uma vez, mudou de rumo e decidiu adotar a técnica gramsciana, que os incultos da guerra cultural bolsonarista, em hostilidade constante com a língua portuguesa, insistem em dizer “gramscista”, teria se infiltrado na cultura, acima de tudo nas universidades e nas artes, para a médio prazo tomar o poder. Essa é a explicação do “Orvil”. Em outras palavras, a esquerda triunfou somente quanto o aparato repressivo foi desativado! Culpa, pois, da distensão proposta por Geisel… O “Orvil” é uma peça de defesa para evitar a acusação! Se você analisa o discurso do ministro da Educação, do presidente Jair Bolsonaro, do Olavo de Carvalho, de seus seguidores e dos bolsonaristas abduzidos pela guerra cultural, toda estratégia retórica vem do “Orvil”. Vem do “Orvil” a fonte da concepção de mundo do bolsonarismo. A guerra cultural bolsonarista retoma literalmente os termos do projeto secreto do Exército e tenta transformá-lo em política pública. O resultado para o País será desastroso. Quando o “Orvil” trata do que seria a quarta fase na narrativa militar a respeito da ditadura, por que Antonio Gramsci e também a Escola de Frankfurt preocupam tanto o bolsonarismo e o novo conservadorismo brasileiro? Em um ambiente democrático não se pode fazer o que a ditadura militar fez, que era prender, torturar, assassinar e desaparecer corpos — e o presidente negou recentemente que tenha havido tortura durante a ditadura, o que é um absurdo completo. Há até relatório do general Ernesto Geisel que reconhece a existência de tortura. Relatório encomendado por Castello Branco, primeiro presidente da ditadura militar. Isso é um fato histórico. Como não é possível mais eliminar fisicamente os adversários, enquanto conseguirmos defender a democracia, o que o bolsonarismo faz por meio das milícias digitais é tentar eliminar simbolicamente. Isso tem sido feito desde o início do governo. Fez-se com Hamilton Mourão (PRTB). O vice-presidente foi enquadrado. Foi feito com Gustavo Bebianno [ex-secretário-geral da Presidência da República]. Sem Gustavo Bebianno, Bolsonaro não teria sido sequer candidato. Quem defendeu Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF) foi Gustavo Bebianno. Quem conseguiu o partido foi Gustavo Bebianno. Quem montou a estrutura de campanha foi Gustavo Bebianno. Ele foi eliminado simbolicamente. Quem é o Hamilton Mourão de verdade: o candidato a vice-presidente com discurso muito próximo ao de Bolsonaro ou o vice-presidente que o sr. diz que teria sido enquadrado pela militância digital? Por isso a deputada Janaína Pascoal não podia evidentemente ocupar a vice-presidência de Bolsonaro. Com Philippe de Orleans e Bragança houve controvérsias e ele não foi escolhido vice. No último momento apareceu o Mourão. A milícia bolsonarista tenta eliminar simbolicamente as pessoas. Morão se enquadrou. Bebianno foi eliminado. O general Santos Cruz [ex-ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência], que no início os bolsonaristas consideravam um ícone, foi eliminado simbolicamente com uma crueldade que nunca se viu na história brasileira. Algo muito preocupante. Nunca generais foram tratados da maneira como essas pessoas foram tratadas. Nunca na história política brasileira. Nem mesmo a guerrilha armada tratava os generais como a milícia bolsonarista trata.Não há paralelo. Nunca um general da importância do Santos Cruz foi assim tratado: vilipendiado e humilhado nas redes sociais como ocorreu com ele. É uma quebra de hierarquia dentro do Exército cujas consequências ainda são nebulosas. Mas há mágoas. A função das milícias digitais é eliminar simbolicamente os inimigos. Os bodes expiatórios surgem e a violência da milícia bolsonarista digital é algo inédito na história política brasileira. Já que existe uma teoria conspiratória delirante de um movimento comunista internacional, e como não se pode eliminar fisicamente, o que se está fazendo é a eliminação das instituições ligadas a toda pauta progressista ou à cultura. A Ancine [Agência Nacional do Cinema] retirou do seu site cartazes de filmes brasileiros, porque muito seriam típicos representantes da esquerda. A Fundação Zumbi dos Palmares hoje é presidida por um senhor que nega a existência do racismo no Brasil. Que é hostil ao negro, embora ele também o seja. Que despediu por telefone todos os funcionários de alto escalão negros da Fundação Zumbi dos Palmares. A Capes está cortando sistematicamente todas as bolsas. As verbas do CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico] estão sendo reduzidas a quase nada. O ministro da Educação não só não consegue realizar uma execução orçamentária minimamente razoável como ainda não apresentou um projeto para o Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica]. Se não houver um projeto para substituir o Fundeb que vai expirar este ano, em 2021 a educação nos municípios será muito prejudicada. Na hipótese que levanto, a doutrina da segurança nacional supõe a eliminação do inimigo interno. Como havia uma situação de guerrilha urbana e de luta armada, a eliminação do inimigo interno não foi a sua prisão, seu exílio ou seu banimento. Foi o seu desaparecimento. Foi a eliminação do corpo. Literalmente. Em um ambiente democrático, a guerra cultural bolsonarista coloca em prática o relatório secreto dos militares, o “Orvil”. Está tudo lá. Foi o que descobri. Como não é possível eliminar fisicamente, elimina-se simbolicamente nas redes sociais. É a tarefa das milícias bolsonaristas. E há um projeto em curso de eliminação, destruição, das instituições ligadas ao meio ambiente, cidadania e cultura. As consequências serão absolutamente desastrosas. Duas pesquisadoras da USP sequenciaram o genoma do coronavírus no Brasil em 48 horas. Em nenhum país do mundo isso aconteceu. Isso só ocorreu porque o laboratório havia recebido verbas de pesquisa. Com a política de corte de verbas do CNPq e de corte de bolsas da Capes, o País entrará em colapso. Se houver outra epidemia daqui a dez anos, não haverá cientista, não haverá laboratório, não haverá pesquisa. O panorama é lúgubre, é sombrio. Mas voltemos à questão da interpretação bolsonarista da dominação pela cultura com uma suposta tática gramsciana. Marcuse tinha algumas análises muito penetrantes de como as sociedades capitalistas haviam criado na aparência de um regime democrático formas muito sutis de controle e repressão. Theodor Adorno tinha uma tese muito importante que era, diante de um capitalismo de uma sociedade automatizada, de uma vida danificada pela planificação de uma sociedade cada vez mais produzida em massa e em série, uma grande recusa diante dessa sociedade cada vez mais padronizada. Essas duas vertentes da Escola de Frankfurt eram francamente críticas de um mundo que hoje chamamos de capitalismo financeiro globalizado, isto é, de formas de consumo, de formas de padrões, que Adorno recusaria, como manifestações da indústria cultural. Por exemplo, se você for a qualquer lugar do mundo, existe um programa The Voice. Se você fora a qualquer lugar do mundo, existe um Big Brother. A primeira vez que fui a Moscou (Rússia), como faço em toda viagem, ligo a televisão para escutar o idioma. Quando não entendo nada, pelo menos escuto o idioma. Tinha acabado de chegar ao hotel, liguei a televisão e me familiarizava com o quarto. Não estava olhando para a televisão. Por algum motivo, tenho a impressão que começo a entender o que estou escutando. O que é impossível, pois nunca estudei o idioma. Mas o tom de voz, o ritmo, o volume, o tipo de discussão. E digo “espere aí, mas estou entendendo isso”. E olhei para a televisão. Você sabe por que eu tinha a impressão de que estava entendendo? Era o Big Brother Russia! É tudo igual. Contra essa padronização dos costumes, contra a padronização da “arte”, Marcuse desenvolveu uma análise muito sutil de formas de repressão de uma sociedade teoricamente livre. A Escola de Frankfurt foi muito importante para o movimento estudantil e para os anos 1960. Mas as análises que são feitas por Olavo de Carvalho e por seus seguidores sobre Marcuse e Adorno são absolutamente indigentes. É óbvio que eles não sabem ler alemão. E não têm ideia do que estão falando. Não leram com cuidado e olhos livres nem Adorno nem Marcuse. Isso é muito claro. Como, por exemplo, houve um momento em que Olavo de Carvalho sugeriu que as composições dos Beatles foram feitas pelo Adorno. Ao ouvir algo assim, é difícil resistir à caricatura. Mas precisamos resistir. Precisamos passar para a caracterização. O que está o que está em jogo é a narrativa do “Orvil”. Porque o nome Marcuse aparece no “Orvil”. O que se diz hoje da guerra cultural gramsciana está no “Orvil”. Esta é a origem. A guerra cultural bolsonarista é inteiramente baseada no relatório secreto do Exército brasileiro chamado “Orvil”. Gramsci está lá. Marcuse está lá. Vou além. A produtora Brasil Paralelo representa, no plano do audiovisual, a difusão da teoria conspiratória do “Orvil”. Porque toda a base da compreensão profundamente equivocada da história política brasileira recente exposta nos filmes do Brasil Paralelo é o “Orvil”. O documentário “1964 – Brasil Entre Armas e Livros” é uma transposição literal para a tela, portanto para o grande público, do “Orvil”. O argumento é tão singelo quanto este: os militares venceram pelas armas, a batalha militar, mas, como propõe o subtítulo, perderam a guerra dos livros. É exatamente a narrativa do “Orvil”. O Brasil Paralelo representa no audiovisual a popularização da narrativa do “Orvil”. E as consequências para a cultura brasileira serão desastrosas, pois levarão a uma ruptura como nunca houve e a uma paralisia administrativa. Não é possível administrar um país com a complexidade do Brasil sem um mínimo de objetividade. Por exemplo, o diretor do Inpe [Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais] adverte que há indícios alarmantes do aumento das queimadas. A resposta de Jair Bolsonaro é movida pela guerra cultural: diretor do Inpe é de esquerda e as ONGs vão promover queimadas porque perderam dinheiro fácil do comunismo internacional. Houve, inclusive, uma tentativa de criminalizar ativistas. O diretor do Inpe foi demitido porque é de esquerda e as ONGs são a representação do mal na Terra. O que ocorreu 30 dias depois? As queimadas foram confirmadas em um número muito maior do que o alerta do Inpe. O ministro da Educação deu uma entrevista na segunda-feira, 2, na qual disse que Paulo Freire era feio, fraco e sem resultados positivos. Se se trata disso, você não trabalhará com serenidade. Consequência: a execução orçamentária do Ministério da Educação é a menor da última década. No serviço público existe o orçamento. Ao contrário do que pensa o grande público, orçamento não quer dizer dinheiro. Quer dizer a previsão de gasto para determinada área. Você não consegue fazer nenhum gasto no serviço público a partir de um certo valor se não tiver licitação, que exige no mínimo três orçamentos, análise de técnicos e outras etapas. Isso quer dizer que não é fácil gastar dinheiro no serviço público. É preciso cumprir uma série de requisitos. As pessoas pensam que o dinheiro está disponível em um banco. Não é assim. O orçamento de um ministério significa que o Congresso aprovou um gasto até aquele teto. Mas para o ministério gastar é preciso gerar projetos com demandas pontuais. É preciso empenhar, uma técnica administrativa que torna aquele valor em dinheiro, que não é pago de imediato. O fato de o ministro ter tido a menor execução orçamentária da última década quer dizer que há uma paralisia administrativa, justamente caudadas pelo delírio da guerra cultural bolsonarista. O Ministério Público Federal (MPF) cobra do Ministério da Educação explicações para entender o motivo de mais de R$ 1 bilhão do fundo da Lava Jato ter ficado parado no órgão em 2019. No serviço público não se pode contratar uma creche distantemente aparentada com qualquer funcionário. Não é dizer que irá pegar R$ 1 bilhão e transformar em voucher. Isso não existe. Não é assim que funciona. A guerra cultural bolsonarista é o núcleo duro do governo. Pode sair o Paulo Guedes [Economia], pode sair o Sergio Moro [Justiça e Segurança Pública], mas não se pode abrir mão da guerra cultural. Se a guerra cultural for abandonada, acaba o governo Bolsonaro. O governo Bolsonaro não tem projeto para o futuro do país. O único projeto do governo Bolsonaro é levar adiante a narrativa conspiratória do “Orvil”, o que implica a destruição de todo um aparato estatal construído desde a Constituição de 1988. As consequências para a sociedade brasileira serão terríveis. Vejamos alguns exemplos. Segundo a lei, quando se apresenta uma solicitação ao INSS a resposta tem de ser dada em até 45 dias. Até o governo de Jair Bolsonaro, a resposta era dada nesse prazo. Agora o tempo médio é de oito meses. O Bolsa Família tem hoje a maior fila da história de pessoas que se qualificam plenamente para o benefício, mas estão sem receber. Até fevereiro, o ministro responsável pelo Bolsa Família, Osmar Terra, era o mesmo que comemorou o fim da fila de beneficiários do programa no governo Temer. Na verdade, é o contrário. Para comprar droga, a pessoa não pode ficar em casa! Além disso, o ministro proibiu a divulgação de uma pesquisa realizada pela Fiocruz. E a guerra cultural é a transposição da doutrina de segurança nacional para o século XXI. A doutrina de segurança nacional implica a eliminação do inimigo interno. Qual é a diferença da guerra cultural bolsonarista que o sr. trabalha na sua pesquisa com a censura nas artes durante a ditadura militar? A guerra cultural bolsonarista é uma ameaça maior à arte, à ciência e à educação do que a ditadura militar. Porque a ditadura militar concentrou os esforços na eliminação do inimigo interno, que era a esquerda da luta armada ou de qualquer forma de oposição ao regime. Contudo, a ditadura militar, ao contrário deste governo, tinha um projeto nacionalista. A ditadura militar, ao contrário deste governo, não vendeu nem sucateou a coisa pública. A ditadura militar, como tinha um projeto de uma pátria grande, investiu em infraestrutura, criou estatais. Essa é uma contradição muito importante. a guerra cultural bolsonarista é mais séria porque está destruindo as instituições associadas ao meio ambiente, à cidadania e à cultura. Quando se coloca na presidência da Fundação Zumbi dos Palmares uma pessoa que nega a existência de racismo no Brasil, alguém que considera que a política de cotas é mimimi, uma pessoa que demite funcionários pelo telefone, você está destruindo a Fundação Zumbi dos Palmares. Quando você realiza uma política que retira da Capes em aproximadamente dois anos algo em torno de 10 mil a 11 mil bolsas, você está destruindo a pesquisa no Brasil. Quando se reduz drasticamente a verba do CNPq a tal ponto que a verba é inferior às benesses de coisas absolutamente desnecessárias do Poder Judiciário, você está destruindo o CNPq. Você não está eliminando as pessoas fisicamente. Você as elimina simbolicamente nas redes sociais pelas milícias bolsonaristas. Mas o que está ocorrendo no País é mais sério do que houve na ditadura militar: hoje, são destruídas todas está destruindo todas as instituições que levamos décadas para construir. Quando o presidente envia vídeos com convocação para as manifestações do dia 15 de março contra o Congresso e o STF, há um incentivo a uma ideia de fechamento dos Poderes Judiciário e Legislativo? Até que ponto o autoritarismo está instalado no governo e até onde as instituições consegue frear esse ímpeto? Não são termos europeus e norte-americanos. São termos profundamente brasileiros, arraigados na interpretação militar revisionista, revanchista, da ditadura militar em resposta ao “Brasil: Nunca Mais”. Há um ressentimento enorme. Há um revanchismo evidente. Há um desejo de destruir todas as instituições que caminharam no sentido do fortalecimento da democracia e da salvaguarda das instituições. Esse é o grande trunfo da Constituição de 1988. O trunfo real da Constituição Cidadão, como é chamada, foi procurar ter salvaguardas para assegurar que nunca mais um projeto autoritário fosse possível no Brasil. A guerra cultural bolsonarista não é uma caricatura, porém uma ameaça real à jovem democracia brasileira. É preciso caracterizá-la. A guerra cultural bolsonarista é a ponta de lança de um projeto autoritário, cuja finalidade é destruir as instituições para estabelecer um governo de ação direta entre as massas e o presidente: destino final da vocação autoritária do bolsonarismo. Na live do dia 27 de fevereiro, o presidente Bolsonaro tenta dizer que os vídeos na verdade são das manifestações de 2015, mas acaba por citar a facada, tentativa de homicídio que só vem a ocorrer 3 anos e 6 meses depois. Há um foco no ataque à imprensa, mas não houve citação do presidente ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), nem aos ministros Celso de Mello e Dias Toffoli, presidente do STF, que criticaram a ação de Bolsonaro… Temos de parar de imaginar que se trata de alguém descontrolado que não sabe o que faz. É o oposto. A guerra cultural bolsonarista é um projeto autoritário que tem como ponta de lança a recuperação da narrativa conspiratória do “Orvil” para justificar que é isso ou a esquerda, assim como na ditadura militar foi possível tornar a tortura política de Estado, tornar o assassinato de adversários políticos “aceitável” e tornar o desaparecimento de corpos “tolerável”. Bolsonaro está jogando o mesmo jogo. É seu autoritarismo ou o retorno do PT. Não somos prisioneiros dessa dicotomia muito pouco inteligente! A guerra cultural bolsonarista é um retrocesso a este passado cuja base é a teoria do “Orvil”. Se não reagirmos a tempo, as consequências para a sociedade brasileira serão terríveis. Um professor universitário intelectual como eu tem de dar a cara a tapa e dizer o que está acontecendo. Estou disposto a dialogar com qualquer bolsonarista. Não tenho problema em dialogar com ninguém. Sou professor universitário e já orientei no mestrado e no doutorado alunos de Olavo de Carvalho. Mantenho diálogo com intelectuais bolsonaristas. Se qualquer bolsonarista quiser discutir comigo, basta marcar o lugar. Irei com as mil páginas do “Orvil” minuciosamente lidas e apresentarei minha hipótese. Se provarem que estou errado, aceitarei. Isso tem de ser feito agora. Se não fizermos isso agora, daqui a um ano você talvez não possa mais fazer esta entrevista comigo. A responsabilidade que tenho ao me expor é porque estou pensando no Brasil. A situação é muito grave. A destruição das instituições pode tornar o Brasil um país atrasado por décadas. Leio o que a direita escreve sem problema algum. Leio e anoto para estar por dentro do que se trata. Assisto aos vídeos dos youtubers de direita. No meu livro vou colocar à disposição do público que se interessar links de vídeos-chave para análise. Há um vídeo do Instituto Borborema de um colunista da Gazeta do Povo, Francisco Escorsim, um intelectual bolsonarista, que discute a guerra cultural. Escorsim define que alguém sabe que está em guerra quando se recusa a escutar o outro. Independente do que o outro fala, você se recusa a escutar, porque se está em guerra cultural. Isso é absolutamente espantoso para um intelectual. Inclusive espantoso que tal gesto pertença a uma guerra “cultural”. Mas é isto a guerra cultural bolsonarista. É um desejo radical de eliminar o outro. Se não compreendermos isso agora, se não fortalecermos as instituições, não sei o que irá acontecer. Não estou questionando a legitimidade da presidência de Jair Messias Bolsonaro. O presidente foi eleito em um pleito democrático com mais de 57 milhões de votos. Bolsonaro é o presidente legítimo do Brasil. Não questiono isso. Mas parto do princípio de que 57 milhões de eleitores e eleitoras que deram voto a Jair Messias Bolsonaro não votaram para que o presidente destruísse as instituições associadas à cultura, à cidadania, ao meio ambiente, à educação, à saúde. Isso é bem importante porque todo meu desejo é dialogar. Quero muito dialogar com quem discorde de minhas opções políticas. E necessário entender porque votaram no Jair Messias Bolsonaro; para tanto, preciso ler o que seus eleitores escrevem e assistir aos vídeos que produzem. Vocês têm todo direito de imaginar que a melhor opção para o Brasil, no contexto de 2018, era votar no Bolsonaro. É um direito que o eleitor tem. E tem de ser respeitado. Ademais, não se esqueça do princípio da alternância do poder. Contudo, o presidente não foi eleito democraticamente para impor um projeto autoritário. Isto tem de ser denunciado. Não questiono a legitimidade, questiono o projeto. O livro já tem data de lançamento ou acerto com alguma editora? Eu não farei o mesmo que fizeram com Dilma Rousseff (PT). É absurdo. Estou denunciando a função autoritária do projeto e estou sugerindo que a guerra cultural é a ponta de lança e a essência deste governo. Precisamos discutir e reverter esta guerra cultural. Caso contrário, daqui até 2022 não sobrará muita coisa. O ex-secretário especial da Cultura Roberto Alvim ficou dois meses no cargo. Depois daquele vídeo publicado nas redes sociais da pasta com trechos de discurso do ministro da Propaganda da Alemanha nazista, Joseph Goebbels, acabou por cair. Mas horas antes chegou a ser elogiado pelo presidente Bolsonaro pelo mesmo direcionamento apresentado no vídeo em uma das lives presidenciais. Alguns analistas disseram que aquela era uma visão do Alvim, que não se tratava de uma ideia de Jair Bolsonaro. Houve, inclusive, uma pressão do presidente do Senado, que é judeu, para tentar convencer Bolsonaro de que era necessário derrubar o Alvim do governo. O projeto representado pelo ex-secretário da Cultura permanece ou caiu junto com o antigo ocupante do cargo, o da criação do Prêmio Nacional das Artes? Acredito que seja muito difícil levar esse projeto adiante. O episódio Roberto Alvim o enterra de vez. Mas Roberto Alvim era uma das pontas de lança do projeto autoritário. Qual é a importância de compreender o Roberto Alvim? Ele não é um caso isolado. Alvim não deve ser compreendido como uma caricatura, como um mero descontrole da técnica da “trolagem”. Ele foi uma explicitação indesejável do caráter autoritário do projeto. Neste sentido, o que proponho com meu livro é explicitar da maneira mais clara possível a natureza autoritária do projeto. Roberto Alvim conta porque, na tentativa de criar uma arte nacional pura, que é um conceito em si mesmo absurdo, explicitou o que se procura ocultar: a natureza autoritária do projeto da guerra cultural bolsonarista. Não é um acidente. É uma ponta de lança. É o motor do governo. O motor do governo é guerra cultural. Sempre que o governo anuncia uma medida, ou o próprio vídeo do Alvim, ao tentar voltar atrás joga a culpa em alguém, como a justificativa da “ação satânica” declarada pelo ex-secretário da Cultura. Chega a ser de fato um recuo? Isto é, Alvim teria sido boicotado porque as instituições culturais estão aparelhadas pela esquerda e há sabotadores de todos os lados. Em consequência, é preciso não abrir mão da estratégia de Roberto Alvim, mas intensificá-la, porém, de modo discreto. É de uma perversão absoluta. A explicação do Alvim, de que haveria uma força demoníaca, é importante de ser entendida não como uma caricatura. Todo meu discurso, supõe levar a sério essa questão. Qual é o segmento da população brasileira que aceita com enorme facilidade o argumento de que um equívoco de uma pessoa boa foi causado por forças demoníacas? Qual é a porção da sociedade que aceita esse argumento? Qual é a porção imensa da sociedade brasileira que tem uma imagem do cotidiano como uma batalha constante contra espíritos malignos e obsessores? A explicação do Roberto Alvim, que para mim é completamente inadequada e tola, é uma explicação que explicita outra característica da guerra cultural bolsonarista. É uma guerra cultural que fala dois idiomas. A guerra cultural bolsonarista fala um idioma que afeta diretamente a professores universitários, artistas, escritores e intelectuais. Mas fala uma outra linguagem. Essa outra linguagem quem a domina é a Damares Alves. É também o ministro da Educação. A guerra cultural também procura calar fundo com o público evangélico. São aproximadamente 45 milhões de brasileiros que têm a imagem do dia a dia como de uma luta constante e permanente contra o mal. Essa visão do mundo acolhe muito bem a narrativa delirante da guerra cultural bolsonarista. Isso explica por que a imagem da ministra Damares Alves é tão bem avaliada como integrante do governo junto aos apoiadores fiéis do presidente Jair Bolsonaro? E tem outro tipo de batalha cultural, que lança mão da ideia de guerra e de batalha do cotidiano, que é a visão de mundo dos indivíduos neopentecostais. Há uma batalha constante contra o maligno. Li o último livro do Edir Macedo, “Como Vencer Suas Guerras Pela Fé: descubra como enfrentar suas batalhas do dia a dia” (Editora Unipro, 2019). Ao ler o livro, tudo para mim ficou claro. A guerra cultural trabalha em vários níveis. Um nível que a guerra cultural trabalha e que, em geral, os intelectuais de esquerda não se deram conta, e para atingir ao público neopentecostal. Para os neopentecostais, sobretudo para a Igreja Universal do Reino de Deus, o mundo e o dia a dia são batalhas constantes. Assisto com seriedade todos os programas evangélicos para entender o que está acontecendo. Faça uma coisa. Se você puder, ao chegar em casa, assista a um programa evangélico. Você verá o tempo todo que nas pregações, sermões e cultos sempre há um inimigo a ser vencido. O inimigo, claro, é Satanás. As pessoas vão para o púlpito e relatam as suas batalhas cotidianas contra o mal. Esta é uma das faces da guerra cultural. É isso que está no livro do Edir Macedo e é o que trabalharei no meu livro. Tentarei mostrar que a guerra cala fundo na percepção neopentecostal, sobretudo da Igreja Universal do Reino de Deus. É por isso que o sr. fala tanto em deixar a caricatura de lado e tentar caracterizar o fenômeno da guerra cultural bolsonarista? Há quem diga que o governo sempre tenta tensionar a relação com a democracia no aguardo de uma resposta violenta da esquerda para justificar um ato mais duro. O sr. acredita que essa seja uma análise possível? Ao analisar o 15 de março convocado pelo presidente com envios de vídeos pelo WhatsApp e como o eleitorado bolsonarista reagiu a pautas como o fechamento do Congresso e do STF, há uma possibilidade de um golpe militar ou a batalha é a da guerra cultural dentro das instituições? Mas este extremo é possível? Estou interessado em dialogar, escapar da bolha. Dialogar com a direita, com os bolsonaristas, compreender seus pontos de vista. Não partir do princípio de que tenho alguma espécie de superioridade intelectual só por ser um professor universitário. Quero dialogar. Quero mostrar minha enorme preocupação. Porque nunca houve na história do País uma polarização tão danosa, de consequências tão desastrosas, que podem genuinamente implicar na destruição de instituições constituídas ao longo de três décadas. A situação é grave. E somente se tornará mais grave se não formos capazes de começar a dialogar. Se não houver um esforço sério de se fazer uma análise da situação presente, não há diálogo possível. Parece risível que se caracterize o governo Bolsonaro como nazista ou fascista. É risível. Porque é uma situação histórica completamente diferente. Não há nenhum rigor nessa rotulação. É muito mais uma espécie de desabafo de quem acha que a situação nunca lhe vai atingir. Se nós não começarmos agora uma discussão séria e cuidadosa sobre as consequências da guerra cultural do governo como ponta de lança de um projeto autoritário, esse projeto autoritário alcançará a todos nós. A hora é agora para propor análises e, sobretudo, recuperar a capacidade da sociedade brasileira de dialogar. A sociedade brasileira como um todo apresenta um sintoma extremamente preocupante, que é totalmente descrito na palestra do Francisco Escorsim no Instituto Borborema, quando ele diz que estar em guerra é fechar os ouvidos para o outro. Fechar os ouvidos para o outro não é estar em guerra. É estar morto vivo. Quando as pessoas perderam a capacidade de dialogar com o outro? Bolsonaro é mais sistêmico do que a maioria dos deputados; ora, ele é o único político que tem três filhos que vivem de recursos públicos como políticos, que tem uma ex-mulher que se elegeu, que tem esta prática no mínimo curiosa de funcionários nos gabinetes, O político mais sistêmico é o Bolsonaro, que ficou 28 anos na Câmara e colocou a família inteira para receber salário público. A grande inteligência de Bolsonaro foi captar o movimento antissistêmico, sendo ele o deputado mais sistêmico. Por que isso foi possível? Porque no lugar de caracterizar o fenômeno Bolsonaro, passamos anos fazendo dele uma caricatura. Se tivéssemos tido o cuidado de caracterizar o fenômeno, mostrando que toda a família ganha salário público, talvez a história tivesse sido outra… Toda família do Bolsonaro vive do imposto que nós pagamos. Como se pode ser antissistema dessa forma? Mas como perdemos anos fazendo caricatura do Bolsonaro, não caracterizamos o fenômeno. Chegou a hora de abandonar a caricatura e caracterizar o fenômeno. Bolsonaro era tratado como piada no CQC, na Luciana Gimenez… Seria um mal da sociedade do meme, que se acostumou com uma comunicação rasa, fácil e engraçada? Até a eleição do Bolsonaro, tudo que fizeram foi caricatura. O que estou dizendo é que chegou o momento de abandonar a caricatura e passar à caracterização. Antes que seja tarde. Entrevista Publicada originalmente em
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