Neymar, o namorado da Jout Jout e os negros que não sabem que são negros. Por Marcos Sacramento |
Cidadania | |||
Sex, 08 de Janeiro de 2016 02:35 | |||
A tomada de consciência desse batalhão de anônimos seria mais efetiva contra a discriminação racial do que um depoimento qualquer de Neymar. Muitos que têm a pele mais clara, como a do jogador do Barcelona, sequer se reconhecem como negros. Um exemplo disso foi o depoimento do Caio, o namorado de 24 anos da youtuber Julia Tolezano, a Jout Jout. No final do ano passado vazaram as fotos do rapaz, de quem os fã da Jout Jout só conheciam a voz. Caio é uma espécie de assistente de produção da moça e às vezes dá uns pitacos por trás das câmeras. Comentários com teor racista seguiram após a descoberta: “Caio na minha imaginação é loiro alto, de olhos azuis e musculoso”, disse um internauta. Outro manifestou-se como se visse o Freddy Krueger: “Prefiro não acreditar nisso. Vou esquecer essas imagens e fingir nunca tê-las visto”. O namorado da Jout Jout resolveu gravar um vídeo para discutir a polêmica e mostrou-se surpreso porque até então não se considerava negro. “Eu estava lá no meio, sem saber o que falar porque eu me considero pardo … considerava, não sei mais”, disse ele no início de vídeo. “Para eu considerar negro no Brasil tenho que ter sofrido algum tipo de racismo (…)? Quem decide isso? É o americano que fala que sou parecido com o Barack Obama ou é o marido da minha mãe que é africano e disse que eu não sou negro? São meus dois avós negros que casaram com minhas duas avós brancas? São meus traços, meu cabelo? Eu que decido? Como é isso? Se eu tive essas dúvidas, se eu não tive essas discussões mais cedo na minha vida, imagino que muita gente deve ter esse mesmo problema que eu. De não conversar, não discutir, e não saber se definir”, continua. Caio não sabia que de acordo com o IBGE a definição de negros engloba pessoas “pardas” e “pretas”. Independente do que ele se autodeclara, seu fenótipo não levantaria dúvidas se ele fosse aprovado por cotas no Concurso do Itamaraty. Da mesma forma, os traços do rapaz podem expô-lo a situações constrangedoras como ser confundido com empregados em alguma festa chique ou mesmo arriscadas, como em uma blitz policial durante a madrugada. Provavelmente Caio cresceu sob a proteção de um ambiente classe média, onde negros podem passar a vida inteira sem receber uma abordagem violenta da polícia. Pode ter sofrido alguma discriminação sutil, ter sido alvo de olhares de seguranças em shoppings e não ter percebido. A pele não muito escura pode ter contribuído para que ele não se sentisse negro. Como Caio, há vários negros que ignoram a própria condição. Muitos chegam a ser contra as cotas raciais, chamam manifestações racistas de simples mal entendidos e rejeitam a influência do passado escravista nos problemas sociais do país. No vídeo, o namorado da Jout Jout disse está se descobrindo, questionando, pesquisando para conhecer a própria identidade. Se mais pessoas fizessem como ele, não haveria disparates como negros chamando os negros militantes de “vitimistas” nem a necessidade de meia dúzia de palavras do Neymar condenando o racismo. Artigo publicado originalmente em http://www.diariodocentrodomundo.com.br/neymar-o-namorado-da-jout-jout-e-os-negros-que-nao-sabem-que-sao-negros-por-sacramento/
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