Nós, mulheres políticas! Por Mirtes Santa Rosa |
Sáb, 29 de Outubro de 2022 04:34 |
Esta semana comecei a ler um livro chamado Nós, Mulheres da autora espanhola Rosa Montero, que fala sobre grandes vidas femininas que muitos desconhecem ou, quando conhecem, não sabem a importância que elas tiveram na história. Trata-se daquele caso: “Você sabe quem é fulana? Sei, mas não lembro o que ela faz ou fez”. O típico já escutei falar mas não me chamou a atenção. Desde a introdução do livro, eu já fiquei com aquela sensação de como somos invisíveis na história, mas muitas vezes somos também invisíveis no dia a dia.
Lembro que, ao ler a biografia de Lula, comentei com pessoas próximas que gostei do livro, mas algo tinha me deixado triste. Que na história incontestável de luta desse grande político brasileiro existiam poucas mulheres com ele nos momentos críticos. Sim, Dona Marisa está lá, mas quando se relata no livro, por exemplo, quem assinou um manifesto contra sua prisão conta-se nos dedos de uma só mão o nome de uma mulher. Eu li marcando o nome das mulheres que apareciam em qualquer contexto na história. Isso me confortava e me fazia pensar: será que existiram mulheres que fizeram parte daquele momento e o machismo não permitiu que elas fossem lembradas ou mesmo que elas fossem escutadas?
Inúmeras vezes me senti sem voz fazendo política, mas nunca me calei. Fiz talvez inimigos, ou no melhor dos casos, fiz com que muitos homens se sentissem incomodados com minha presença. Quando eu decidi que queria empreender na comunicação democrática e criar um podcast, apesar de ter a certeza que ia dar certo, tive medo do fracasso e do ridículo. Aí, entre muitas conversas conheci o projeto A Arte de Falar da atriz Mariana Freire que me ajudou a me olhar enquanto mulher política. Certa vez o meu desafio foi montar um texto a partir da seguinte frase de Audre Lorde: “E essa visibilidade que nos faz tão vulneráveis, é também a fonte de nossa maior fortaleza. Porque a máquina vai tratar de nos triturar de qualquer maneira, tenhamos falado ou não”. Fiz o texto, gravei um vídeo falando do texto e aconteceu uma catarse dentro de mim. Foi lindo esse momento. A liberdade de ser uma mulher política é empolgante e desafiadora. Essa frase hoje me acompanha.
Hoje entendo que o trabalho que Rosa Montero fez quando escreveu sobre as mulheres no El País, antes mesmo de virar livro tinha como objetivo encorajar nós mulheres a sermos quem quisermos ser. Assim como os homens podemos ser boas ou ruins, malvadas ou não e tá tudo bem, pois somos iguais em participação da história. E é nesse ponto de que somos iguais na relevância da história que podemos mudar a história desse país. Temos a obrigação de começar a contar as histórias a partir do olhar feminino. Onde nós estávamos? O que fazíamos? Porque fazíamos? Podemos e devemos começar com as eleições presidenciais deste ano. Desde o começo, sabíamos que as eleições seriam decididas por nós. Somos maioria na hora de votar, mas minoria nos palanques e nas câmaras legislativas, sem falar do poder executivo. Mas o que não quer calar é que somos nós mulheres que fazemos a história. Somos nós que nos mobilizamos, somos nós as chamadas para conversar com outras mulheres sobre seus medos e dúvidas, para validar o compromisso de muitos candidatos homens.
No máximo, aprendemos que somos mobilizadoras sociais. É urgente contar novas histórias e novas histórias sobre as mulheres que fazem política no Brasil. Que cada mulher que fez e faz política neste país tenha o direito de ser reconhecida em seu lugar de fala, mas do que estatísticas de pesquisas eleitorais, que a partir desse recomeço de país possamos estar nas histórias contadas nas salas de aula, nas crônicas dos jornais, nos noticiários políticos, nas redes sociais ou no que ocorrer da melhor forma possível a partir das escolhas dessas mulheres. Cabe a nós mais uma vez reconstruir este país, juntando seus cacos e colando cada parte com cuidado e perseverança e que, no futuro, homens e mulheres, ao contar para as próximas gerações como foi esse período político na Bahia e no Brasil, lembrem-se de Lídice da Mata, Maria Marighella, Arany Santana, Vilma Reis, Cristiane Taquari, Luciana Mandelli, Roberta Sampaio, Dilma Rousseff, Gleisi Hoffmann, Mônica Iozzi, Ana Estela Haddad, Luiza Erundina, Janja Silva, Camila Pitanga, Anielle Franco, Marta Rodrigues, Eliane Koshima, Poena Carmo, Samantha Marchiori, Karina Teixeira, Bruna Brelaz, Julieta Palmeira, Olivia Santana, Fabíola Mansur, Tâmara Azevedo, Conceição Evaristo, Eliana Alves Cruz, Manuela D’ávila, Lilia Schwarcz, Marina Silva, Simone Tebet, Cynara Menezes e tantas outras que parecem anônimas, mas que sem elas não existiriam as histórias para contar, exemplos a seguir, com seus erros e acertos nos embates políticos, e que são tão necessários e urgentes em nosso país. Que as novas Rosa Montero, encontrem um caminho próspero e cheio de histórias interessantes, com bons plot twists narrativos para vender bastante livros e, quem sabe, vender os direitos da história para plataforma de streaming que esteja cheia de dinheiro na época. Mirtes Santa Rosa é publicita?ria e especialista em Comunicac?a?o e Gerenciamento de Marcas e também trabalha com planejamento estratégico comunicacional de projetos culturais, no qual pode mesclar suas duas maiores habilidades profissionais: gestão e comunicação. É umas das idealizadoras e apresentadoras do Umbu Podcast. Artigo publicado originalmente em https://portalsoteropreta.com.br/opiniao-nos-mulheres-politicas-por-mirtes-santa-rosa/ |
Última atualização em Sáb, 29 de Outubro de 2022 04:52 |
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