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De rolê em rolêzinho por Danielle Ferreira
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Qui, 16 de Janeiro de 2014 05:09

Danielle_Ferreira2Até pouco tempo atrás, quando ainda podia me considerar uma adolescente, rolê era - ainda é - uma expressão cultural brasileira própria de nossa juventude.

A ideia de "dar um rolê" é a busca por divertimento, de poder encontrar com os amigos, paquerar, dar risadas, curtir um(ns) estilo(s) musical(is), fazer parte de um grupo social. No entanto, desde o final de 2013 os rolês de jovens em refinados shoppings ganharam contornos de agitação política, de afirmação racial, social e identitária.

Mas porque os jovens da periferia são seres indesejáveis nos shoppings? Quais características permitem afirmar que este/a ou aquele/a não é digno de dá um rolê nesses centros de consumo? Por que os rolêzinhos viraram caso de Polícia? Por que a Justiça brasileira corrobora com os interreses dos setores privados e da elite dando-lhes a possibilidade de incriminar e encarcerar nossos jovens?

No espectro de opiniões há os que acreditam que os rolês possuem componente de ordem social sem envolvimento com racismo, entendendo que em ordem social estão inseridos os elementos sobre organização espacial das cidades e nestas não existe espaços públicos de socialização para juventude, sendo os shoppings a válvula de escape para esse público juvenil que quer só se divertir, e há os que vêem saltar aos olhos o preconceito racial que sofreram esses jovens.

Vale ressaltar que os rolês também são reflexo da inserção de uma grande parte da população no grande mercado de consumo do nosso país, gente das camadas populares socieconômicamente desfavorecidas que antes não possuiam condições financeiras de frequentar e comprar nesses shoppings, mas que atualmente estão com bala na agulha, e sim, podem tanto quanto qualquer outro desfrutar dos privilégios do consumo.

As grandes caixas de vidro onde se vendem sonhos são pra elite desse país um local imune. Imunidade á pobreza, a violência e a negritude que rodam o lado de fora, o mundo real, onde não existe tanta beleza e luxo como existe em cada vitrine. Portanto, permitir que jovens, negros/as periféricos entrem nas suas caixas de vidro é, na concepção da elite abastarda, a perda do esconderijo seguro, do lugar onde era impossível que gente preta estivesse sentada no mesmo restaurante chique que os ricos frequentam.

De certo que discorrer sobre as relações raciais no Brasil não é uma coisa simples, estanque, pontual, pelo contrário, é uma questão imensamente complexa, cheia de imbricações e ramificações, o racismo brasileiro é cruel e silencioso, tem a sua marca no fenótipo e condição social dos indíviduos.

Mas se os rolês em nada tem a ver com discriminação racial, porque no Espiríto Santo os jovens que curtiam o funk próximo ao Shopping Vitória ao se refugiarem da polícia no interior do shopping foram brutalmente expulsos, considerados indivíduos violentos e potenciais criminosos, com direito á escolta da polícia até a saída e aplausos de clientes satisfeitos com a ação policial no centro de consumo? Porque em São Paulo a polícia utilizou armamento ostensivo para impedir a entrada dos jovens no Shopping Itaquera?

Dentre outros elementos, a cor da pele tem sido o critério crucial que possibilita o livre a acesso aos shoppings. Se você for branco com boa aparência e pobre circulará livremente pelas lojas, porém, se for negro, "bem ajeitado" e rico terá seguranças que te acompanharão durante todo o período em que estiveres circulando pelas lojas. A sensação pra quem é negro/a é de milhares de olhos medindo e policiando seus passos.

Não podemos perder de vista que os shoppings são propriedades privadas, ou seja, pertencem a alguém ou a grupos nacionais e internacionais endinheirados, e mesmo sendo estes propriedade de alguém o dono/a não pode decidir quem deve ou não frequentar o seu shopping,  o agravante está no quando só os que não serão bem-vindos àquele centro de lojas são os 'indesejáveis' jovens, negros e periféricos. Não existem evidências que permitam dizer que estes jovens são inferiores para darem os seus rolês nesses espaços, é o olhar treinado preconceituosamente do segurança privado que fica á porta do shopping que definirá quem pode ou não entrar, e estes, se baseiam na aparência, no jeito que se vestem e na forma de falar desses jovens.

No entanto, não deixei de considerar a opinião de que os rolêzinhos são um 'problema' de ordem social, ainda que discorde das opiniões sobre a inexistência de preconceito racial nesse contexto, preciso concordar que os rolês são uma questão referente á organização social de nossa juventude, mas não só isso, essa é uma questão sobre os valores sociais que temos priorizado.

É real a afirmação de que falta aos jovens, principalmente os/as de periferia, lugares de lazer, diversão e que nosso crescimento baseado no consumo tem incutido na consciência de nossos homens e mulheres, jovens e crianças que o importante 'é que o você tem', na perspectiva material desta expressão.

Porém, é equivocado colocar a falta de espaços de diversão para nossa juventude periférica como elemento central de resolução para os rolêzinhos, ter lugares para a juventude é ítem indispensável ao seu desenvolvimento enquanto jovem cidadãos e cidadãs. O ideiário não pode ser que em se possibilitando espaços de socialização nas comunidades periféricas em que residem os nossos jovens, estes, não possam ter livre acesso aos shoppings, podendo exercer sem a alcunha do preconceito racial  o direito de ir e vir, comprar e usufruir destes espaços

Desejo, portanto, que os rolêzinhos continuem acontecendo, batendo na porta da elite nacional e nos seus grandes centros de consumo pra dizer que nós negros/as não somos invisíveis e nem inferiores. Desejo que após 25 anos da lei que criminaliza o racismo em nosso país, marco da história de reparação e promoção da igualdade racial no Brasil, o racismo seja questionado, coibido e combatido todos os dias.

Danielle Ferreira, é mulher negra, dirigente da União Nacional dos Estudantes, Secretária Nacional de Cultura da JPT e da Coordenação Nacional do Coletivo Quilombo.

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Última atualização em Qui, 16 de Janeiro de 2014 05:16
 

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