A aula de jornalismo de Glenn Greenwald na entrevista com Lula. Por Paulo Nogueira |
Cidadania | |||
Seg, 11 de Abril de 2016 21:33 | |||
Disse ontem que a entrevista de Mírian Dutra por Mariana Godoy foi uma lição de mau jornalismo. É com satisfação que digo agora que a entrevista de Lula por Glenn Greenwald foi o oposto: uma aula magna de jornalismo. (Aqui, em português.) Greenwald não deixou de fazer uma única pergunta indigesta a Lula. Foi firme, foi sereno, foi respeitosamente altivo. Falou quando tinha que falar, ouviu quando tinha que ouvir, contrapôs quando tinha que contrapor. Greenwald é americano radicado no Brasil, onde mora com seu companheiro. É um jornalista de esquerda, e tem prestígio mundial. Já levou um Pulitzer, o maior prêmio global de jornalismo. Greenwald se colocou também quando achou que devia. Por exemplo, ao falar da imprensa brasileira. Para um americano como ele, é chocante ver o comportamento da mídia. Três famílias “muito ricas”, sublinhou ele, sabotam a democracia e se dedicam a defender seus interesses – os da plutocracia. Greenwald não consegue entender como isso pode acontecer numa sociedade razoavelmente avançada como o Brasil. Parte da responsabilidade deve ser atribuída ao próprio PT de Lula, que em doze anos de poder jamais ousou enfrentar a tirania das empresas jornalísticas, numa tentativa de conciliação que se provou desastrosa e, talvez, suicida. Ano após ano, com monotonia chocante, Lula primeiro e Dilma depois continuaram a prática de antecessores de inundar de dinheiro público Globo, Abril, Folha e demais grandes empresas de jornalismo. O caso mais absurdo é o da Globo: 500 milhões de reais ao ano em propagandas federais, mesmo com audiências declinantes e um jornalismo brutalmente deformado e deformador, como notou Greenwald em sua entrevista a Lula. Não é exagero dizer que o exército de jornalistas antidemocracia da Globo, e não só dela, foi paradoxalmente financiado pelo PT. Este tópico não foi abordado na entrevista, e é uma pena. Um outro instante em que o entrevistador quase pediu socorro ao entrevistado para entender uma aberração brasileira disse respeito a Eduardo Cunha. Como explicar a um estrangeiro, perguntou Greenwald, que um corrupto contra o qual pesam provas tão esmagadoras continue na presidência da Câmara e lidere algo tão dramático quanto um processo de impeachment? Cunha, é certo, foi protegido por políticos como Aécio, pela mídia, pela Lava Jato de Moro e, se não bastasse tudo isso, pela Justiça: o STF o viu, de braços cruzados, fazer horrores, mesmo depois de conhecidos seus crimes de corrupção. Dados todos estes descontos, é certo também que faltou mobilização popular para afastar e prender Cunha. Os movimentos sociais que recentemente saíram às ruas contra o golpe não se dedicaram a varrer Cunha da vida pública. Tivessem se mexido como agora, e Cunha estava na cela. Lula não conseguiu explicar convincentemente a Greenwald a invulnerabilidade de Eduardo Cunha. Ninguém consegue explicar. E ninguém consegue entender. Um ladrão pode ocupar a presidência da República, caso o golpe passe. É uma possibilidade real e aterradora, e contra ela os brasileiros têm que se bater epicamente nesta semana vital para o destino da democracia. Artigo publicado originalmente em http://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-aula-de-jornalismo-de-glenn-greenwald-na-entrevista-com-lula-por-paulo-nogueira/
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