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Imagine na Suíça! por Marcelo Zero
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Cidadania
Sáb, 14 de Junho de 2014 19:08

Marcelo_ZeroA histérica reação da mídia conservadora e da oposição ao Decreto nº 8.243, que regulamenta a Política Nacional de Participação Social, é uma demonstração clara do seu afastamento da realidade.

Não apenas da realidade brasileira, mas da realidade mundial.

Com efeito, não se passa um dia sequer sem que sejam publicados, na Europa e nos EUA, artigos e estudos que tratam da grande preocupação institucional e política do momento: a crise das democracias representativas.

E elas, de fato, estão em crise. Uma crise que se revela, principalmente no continente europeu, em claros fenômenos, como o baixo índice de comparecimento às urnas, a degradação da imagem pública da política e dos políticos, o crescimento dos votos de protestos, o surgimento de partidos e candidatos de propõem soluções “simples” e autoritárias para todos os problemas, o crescimento de forças e partidos ultranacionalistas e francamente nazistas e, por último, e mais importante, a propagação de uma descrença na democracia e suas instituições como instâncias capazes de resolver os problemas da população.

Obviamente, essa crise da democracia representativa tem relação estreita com a crise do capitalismo. Não me refiro somente à recessão, mas à crise de legitimidade do capitalismo hiperconcentrador. Não é toa que o livro de Picketty venha causando tanto alvoroço. Nos países avançados, o capital voltou a exibir níveis de concentração de riqueza, renda e poder que tendem a comprometer o funcionamento das democracias.

A crise econômica aguçou essa percepção de incompatibilidade última entre a hiperconcentração do capitalismo desregulado e os sistemas democráticos. Daí surgiram os movimentos dos “indignados” europeus, do Occupy Wall Street e de tantos outros que questionam fortemente as atuais instituições democráticas.

A incapacidade dos sistemas políticos instituídos de darem resposta às questões prementes do desemprego, da redução de salários e de benefícios sociais e da falta de perspectivas, principalmente para os jovens, alimenta um niilismo político perigoso. Há o crescimento de uma franca rejeição ao voto, visto como algo inútil que alimenta um sistema que não oferece reais perspectivas de mudança.

Nesse bojo, voltou-se a debater seriamente a questão da democracia participativa e direta.

Há inúmeras ideias e propostas. Vão desde a chamada “democracia líquida”, sistema no qual os representantes são eleitos para temas específicos, até a radical e simples extinção de qualquer sistema de representação.

Mas, embora as propostas sejam variadas, a maior parte das forças políticas considera necessário que os sistemas políticos incorporem, cada vez mais, mecanismos de democracia participativa, como forma de minorar a crise de legitimidade da democracia baseada somente ou fundamentalmente na representação política.

Evidentemente, a democracia direta não é nenhuma novidade histórica. A democracia nasceu direta na Atenas das ágoras. Ela tornou-se fundamentalmente representativa muito tempo depois, já na era moderna. Numa sociedade vasta, complexa e diversificada, a representação política é necessária, pois a democracia estritamente direta numa sociedade desse tipo muito provavelmente não seria funcional. Mesmo com os novos meios digitais, é difícil imaginar ágoras com 120 milhões de eleitores.

Porem, apesar da representação política ser necessária, ou ainda necessária, ela já incorpora, em muitos países, alguns mecanismos de democracia participativa, como referendos e plebiscitos, o recall, a iniciativa popular e os conselhos destinados a recolher a opinião dos movimentos sociais e dos cidadãos comuns.

Em alguns casos, esses mecanismos têm tanta ou mais importância que os sistemas de representação. A Suíça, por exemplo, é oficialmente uma democracia semidireta, na qual os cidadãos dos cantões têm grande autonomia para propor e aprovar leis ou para rejeitar medidas propostas por seus representantes. Qualquer cidadão pode questionar qualquer medida aprovada pelos representantes políticos. Basta recolher 50.000 assinaturas em 100 dias para que um referendo definitivo sobre o assunto seja convocado. Assuntos que são realmente relevantes são decididos, na verdade, por plebiscitos e referendos. Em dois cantões, Appenzell InnerrhodenGlarus, o sistema é unicamente direto. Tudo é decido nas tradicionais Landsgemeinde, reuniões de cidadãos comuns.

No Brasil, a Constituição de 1988 consagrou a democracia direta como forma legítima de exercício do poder pelo povo brasileiro. De lá para cá, as conferências nacionais, a ouvidoria pública, as audiências e consultas públicas, as comissões de legislação participativa, etc., deram relevante contribuição à nossa democracia. As conferências, em particular, vêm contribuindo bastante com o processo legislativo do Brasil.

Estudo de dois pesquisadores da UERJ, Thamy Pogrebinschi e Fabiano Santos, intituladoParticipação como Representação: O Impacto das Conferências Nacionais de Políticas Públicas no Congresso Nacional, demonstra que, entre 1988 e 2009, quase 20% dos projetos de lei e praticamente a metade das PECs que circularam no Congresso Nacional resultaram de diretrizes emanadas das conferências nacionais.

É bom lembrar que um projeto de grande impacto, o da “ficha limpa”, resultou de iniciativa popular. Também é bom não esquecer a experiência do orçamento participativo, que hoje é estudada no mundo inteiro.

Assim sendo, o decreto demonizado pela mídia oligopolizada e por parlamentares conservadores apenas regulamenta uma incipiente, porém já rica experiência de democracia participativa no Brasil. Uma experiência que está em perfeita sintonia com a experiência de outros países democráticos e com a tendência praticamente mundial de alargar o processo democrático com mecanismos robustos de democracia participativa.

Essa experiência ajuda o sistema político brasileiro, ainda muito marcado por práticas fisiológicas e distorcido pela influência excessiva do poder econômico, a colocar-se em maior sintonia com as justas reivindicações emanadas das manifestações de junho de 2013.

Contudo, há aqueles que não reconhecem isso. Provavelmente são os mesmos que se opõem à Reforma Política proposta pela presidenta. Querem manter sua influência exclusiva e suas prerrogativas intocadas. Querem o voto do eleitor a cada 4 anos e, no ínterim, prestar contas somente aos lobistas e empresários que financiaram as suas campanhas. Não querem saber realmente de participação popular. Não querem nem levar em consideração as propostas populares, como o decreto timidamente estipula.

Para eles, provavelmente o povo é apenas um detalhe incômodo. Em seu devaneio francamente reacionário, eles consideram que a tímida Política Nacional de Participação Social equivale a instaurar uma república de sovietes no Brasil.

Bom, se no Brasil é assim....  Imagina na Suíça!

(*) Marcelo Zero é formado em Ciências Sociais pela UnB e assessor legislativo do Partido dos Trabalhadores

Artigo publicado originalmente em http://www.istoe.com.br/colunas-e-blogs/coluna/368492_IMAGINE+NA+SUICA+

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