A saudade do servo na velha diplomacia brasileira |
Meio Ambiente & Sustentabilidade | |||
Dom, 30 de Maio de 2010 11:56 | |||
O filósofo F. Hegel em sua Fenomenologia
do
Espírito analisou detalhadamente a dialética do senhor e do servo. O
senhor
se torna tanto mais senhor quanto mais o servo internaliza em si o
senhor, o que
aprofunda ainda mais seu estado de servo. A mesma dialética identificou
Paulo
Freire na relação oprimido-opressor em sua clássica obra Pedagogia do
oprimido. Com humor comentou Frei Betto: "em cada cabeça de oprimido
há uma
placa virtual que diz: hospedaria de opressor". Quer dizer, o opressor
hospeda
em si oprimido e é exatamente isso que o faz oprimido. A libertação se
realiza
quando o oprimido extrojeta o opressor e ai começa então uma nova
história na
qual não haverá mais oprimido e opressor mas o cidadão
livre.
Escrevo isso a
propósito de
nossa imprensa comercial, os grandes jornais do Rio, de São Paulo e de
Porto
Alegre, com referência à política externa do governo Lula no seu afã de
mediar
junto com o governo turco um acordo pacífico com o Irã a respeito do
enriquecimento de urânio para fins não militares. Ler as opiniões
emitidas por
estes jornais, seja em editoriais seja por seus articulistas, alguns
deles,
embaixadores da velha guarda, reféns do tempo da guerra-fria, na lógica
de
amigo-inimigo é simplesmente estarrecedor. O Globo fala em
"suicídio
diplomático"(24/05) para referir apenas um título até suave. Bem que
poderiam
colocar como sub-cabeçalho de seus jornais:"Sucursal do Império" pois
sua voz é
mais eco da voz do senhor imperial do que a voz do jornalismo que
objetivamente
informa e honestamente opina. Outros, como o Jornal do Brasil,
tem
seguido uma linha de objetividade, fornecendo os dados principais para
os
leitores fazerem sua apreciação. As opiniões revelam pessoas que têm saudades deste senhor imperial internalizado, de quem se comportam como súcubos. Não admitem que o Brasil de Lula ganhe relevância mundial e se transforme num ator político importante como o repetiu, há pouco, no Brasil, o Secretário Geral da ONU, Ban-Ki-moon. Querem vê-lo no lugar que lhe cabe: na periferia colonial, alinhado ao patrão imperial, qual cão amestrado e vira-lata. Posso imaginar o quanto os donos desses jornais sofrem ao ter que aceitar que o Brasil nunca poderá ser o que gostariam que fosse: um Estado-agregado como é Hawai e Porto-Rico. Como não há jeito, a maneira então de atender à voz do senhor internalizado, é difamar, ridicularizar e desqualificar, de forma até antipatriótica, a iniciativa e a pessoa do Presidente. Este notoriamente é reconhecido, mundo afora, como excepcional interlocutor, com grande habilidade nas negociações e dotado de singular força de convencimento. O povo brasileiro abomina a subserviência aos poderosos e aprecia, às vezes ingenuamente, os estrangeiros e os outros povos. Sente-se orgulhoso de seu Presidente. Ele é um deles, um sobrevivente da grande tribulação, que as elites, tidas por Darcy Ribeiro como das mais reacionárias do mundo, nunca o aceitaram porque pensam que seu lugar não é na Presidência mas na fábrica produzindo para elas. Mas a história quis que fosse Presidente e que comparecesse como um personagem de grande carisma, unindo em sua pessoa ternura para com os humildes e vigor com o qual sustenta suas posições . O que estamos assistindo é a contraposição de dois paradigmas de fazer diplomacia: uma velha, imperial, intimidatória, do uso da truculência ideológica, econômica e eventualmente militar, diplomacia inimiga da paz e da vida, que nunca trouxe resultados duradouros. E outra, do século XXI, que se dá conta de que vivemos numa fase nova da história, a história coletiva dos povos que se obrigam a conviver harmoniosamente num pequeno planeta, escasso de recursos e semi-devastado. Para esta nova situação impõe-se a diplomacia do diálogo incansável, da negociação do ganha-ganha, dos acertos para além das diferenças. Lula entendeu esta fase planetária. Fez-se protagonista do novo, daquela estratégia que pode efetivamente evitar a maior praga que jamais existiu: a guerra que só destrói e mata. Agora, ou seguiremos esta nova diplomacia, ou nos entredevoraremos. Ou Hillary ou Lula. A nossa imprensa comercial é obtusa face a essa nova emergência da história. Por isso abomina a diplomacia de Lula.
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