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Boston, Brazil: o PGR e a defesa da Lava Jato, por João Feres Jr
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Dando o que Falar
Ter, 26 de Abril de 2016 01:56

joao_feres_2O contexto era a Brazil Conference, um evento anual promovido por alunos brasileiros de Harvard e MIT e que conta com o financiamento da Fundação Lemann, da ABInBev, ambos de Jorge Paulo Lemann, do Instituto Península, de Abílio Diniz, Credit Suisse, e de mais alguns outros patrocinadores menores.

Era notável entre os estudantes a predominância de carreiras como business e administração, economia e direito. Durante o evento muitas vezes se ouviu a frase de que se trata “da futura elite que vai dirigir nosso país”.

O lema da conferência foi logo enunciado pelo jovem que introduziu a palestra inaugural: “estamos aqui para ajudar a construir o Brasil que a gente quer ver, o novo Brasil”. A lista de pessoas chamadas para pensar esse “novo Brasil” teve nomes como Rodrigo Janot, Abílio Diniz, Neca Setubal, José Olympio Pereira, Ayres Britto, Joaquim Falcão, Marconi Perillo, Alessandro Molon e Otaviano Canuto, além de alguns outros empreendedores e acadêmicos, entre eles eu, que fui convidado para apresentar trabalho em uma mesa sobre políticas de ação afirmativa, assunto que pesquiso há anos.

Os palestrantes, um após o outro, com raras exceções, repetiam este bordão de “pensar o novo Brasil”. Tal senha tinha um significado muito claro, tratava-se de saudar a nova era que se inaugura com a expulsão de Dilma e do PT da Presidência da República, coisa explicitada por mais de um apresentador. O evento transcorreu assim, como um misto de celebração e de reunião de trabalho para planejar o Brasil sem o PT.

O primeiro a discursar foi o PGR Rodrigo Janot. Começou falando diretamente da Operação Lava Jato sem sequer citar o nome, como se fosse óbvio que aquele era o assunto sobre o qual a palestra versava. Seguiu-se uma seção monótona durante a qual Janot gabava-se dos números da operação em termos de prisões, investigações, indiciamentos, etc.

Acrescentou já no início que fez contatos com membros do judiciário italiano envolvidos na operação Mani Pulite para ter certeza de que a Operação tupiniquim não repetisse os mesmos erros que seu “modelo” italiano. Segundo Janot, o fato de a Mani Pulite ter jogado o poder do Estado nas mãos de Berlusconi, um político corrupto, constitui atestado de sua falência.

Em seguida, o Procurador Geral defendeu que a Lava Jato só foi possível porque o Ministério Público, a partir da Constituição de 1988, conquistou autonomia administrativa, orçamentária e funcional. Acima de tudo, celebrou, a escolha do PGR é feita pelo presidente da república a partir de lista tríplice interna, e aprovada em sabatina pelo senado. A grande virtude deste procedimento, segundo ele, é que o PGR obrigatoriamente tem que sair dos quadros do próprio MP.

Essa elegia à corporação que comanda foi então estendida ao judiciário. Janot disse que na ação penal 470, vulgo Mensalão, o STF julgou e condenou “poderosos”, só não usou a expressão “nunca na história deste país” por razões que a essa altura já estavam ficando óbvias. De burocrática a fala do PGR foi ficando cada vez mais politizada. Logo em seguida, emendou em tom mais dramático a tese de que o Mensalão revelou uma organização criminosa que é a mesma da Lava Jato. Voltando para a Lava Jato, protegeu Moro sem citar-lhe o nome, ao dizer que os procedimentos jurídicos tomados durante a operação estavam dentro da constitucionalidade.

Na senda da interpretação política, mas voltando para o MP, Janot festejou o fato de que a PEC 37, proibindo poderes investigativos à corporação, mobilizou as massas que foram às ruas em 2013 e puseram pressão a ponto de reverter a propensão da Câmara que era claramente de aprová-la. A narrativa a essa altura já estava bem clara. A política está corroída pela corrupção, o “povo” percebeu isso e se revoltou, dando ao MP maiores condições de cumprir seu papel de salvador da república, auxiliado pelo judiciário.

Sua conclusão foi peremptória: não há qualquer golpe, as instituições estão funcionando muito bem, sem qualquer problema. Foi aplaudido longamente por uma plateia em pé.

Examinada friamente, contudo, a estória contada pelo PGR é escandalosamente contraditória. Ele disse que pretendia evitar os erros da Mani Pulite, correto, caro leitor? Pois bem, tomemos o processo todo como um caixa preta, sem nos preocupar com detalhes de sua condução: ao fim ao cabo a caçada à corrupção do PT fez com que o poder do Estado que desfruta de legitimidade popular mais intensa, o executivo, fosse parar nas mãos de Michel Temer, um membro do PMDB, partido que junto com o PP tem o maior número de políticos investigados por corrupção na própria Lava Jato, e político que obém nenhuma legitimidade do voto popular (não nos enganemos, os eleitores votaram em Dilma, Lula e o PT) e de Eduardo Cunha, agora vice-presidente de fato, político que o próprio Janot já acusou duas vezes no Supremo Tribunal Federal de esquema milionário de corrupção e até de ameaçar a vida de outro parlamentar. O PMDB e o PP, campeões da corrupção, vão ser a base parlamentar do novo governo. Em suma, em nome da luta contra a corrupção a Lava Jato vai redundar na cassação do voto popular dado em 2014 e entregar o governo para políticos ainda mais corruptos e ilegítimos.

É deprimente notar que a massa de estudantes brasileiros de Harvard e MIT, os supostos futuros líderes do novo Brasil, que se levantou para aplaudir Janot não teve capacidade intelectual para perceber tal falácia escandalosa. Isso certamente fala contra os critérios de seleção usados no programa Ciência Sem Fronteiras e nos programas de bolsas da CAPES e CNPq. Ou será que somente uma questão de etos de classe e de raça?

O PGR manteve-se na trincheira do corporativismo o tempo todo. Não teve uma palavra crítica a respeito do comportamento altamente politizado dos procuradores de Curitiba, vazamentos seletivos das investigações para a imprensa, ou dos abusos cometidos por Moro.

No final das contas, Janot não cumpriu à risca a tarefa de imaginar um novo Brasil, mas certamente ofereceu uma justificativa racional para a narrativa que depois seria muitas vezes repetida durante o evento: o PT criou o maior esquema de corrupção do país; livrando-nos do PT, estaremos inaugurando um novo tempo.

Um dos presentes, que não o aplaudiu de pé, lembrou-o que Fernando Henrique Cardoso escolheu o 17º nome da lista do MP para PGR e não o primeiro de uma lista tríplice. Ele respondeu que a escolha da lista tríplice não é imposição legal, mas se tornou usual nas últimas escolhas, sem sequer citar o nome de Lula, o criador desta prática.  Lula, por sinal, até há pouco percorria o Brasil se gabando de ter dado autonomia às corporações do Estado, particularmente à PRG, ou seja, se gabando de abrir mão do direito que o voto popular lhe deu de escolher o chefe de um poder cujo único mecanismo de accountability é esse: a escolha presidencial. Criou um monstro que, com a ajuda daqueles interessados em anular as eleições de 2014, engoliu a república e agora vai por aí a arrotar suas vanglórias. Só não recomendo chegar muito perto, pois o odor é fétido.

Artigo publicado originalmente em http://jornalggn.com.br/noticia/boston-brazil-o-pgr-e-a-defesa-da-lava-jato-por-joao-feres-jr

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